A vice-presidente executiva Margrethe Vestager, responsável pela política de concorrência, afirmou: «O mundo está a mudar rapidamente e é importante que as regras da concorrência acompanhem essa mudança. As nossas regras têm uma flexibilidade intrínseca que nos permite lidar com um vasto leque de práticas anticoncorrenciais nos mercados. Consideramos, no entanto, que existem certos riscos estruturais para a concorrência, como o tipping dos mercados, algo que não é abrangido pelas regras atuais. Pretendemos obter os pontos de vista das partes interessadas para explorar a necessidade de um eventual novo instrumento de concorrência que permita resolver esses problemas estruturais de concorrência, de forma atempada e eficaz, garantindo mercados justos e competitivos em todos os setores da economia.»
Necessidade de um novo instrumento de concorrência
Nos últimos anos, a Comissão tem vindo a refletir sobre o papel da política de concorrência e a forma como esta se enquadra num mundo que está em rápida mutação, que é cada vez mais digital e globalizado e que precisa de se tornar mais ecológico. Este processo de reflexão faz parte de um debate político mais amplo sobre a necessidade de alterar o atual quadro normativo da concorrência, de modo que as agências de execução em todo o mundo possam continuar a preservar a competitividade dos mercados. Diferentes partes interessadas participaram neste debate e contribuíram com relatórios e estudos, apresentando propostas sobre a forma de adaptar ou alargar os instrumentos do direito da concorrência.
Neste contexto, a Comissão concluiu que é provável que garantir a contestabilidade e o funcionamento equitativo dos mercados em todos os setores da economia exija uma abordagem holística e abrangente, com ênfase nos três pilares que se seguem:
1) A aplicação firme e continuada das regras de concorrência em vigor, fazendo pleno uso dos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), incluindo o recurso a medidas provisórias e a medidas de reparação, se for caso disso;
2) Uma possível regulamentação ex ante das plataformas digitais, incluindo requisitos adicionais para as plataformas que desempenhem um papel de controlador de acesso (gatekeeper); e
3) Um eventual novo instrumento de concorrência para lidar com os problemas estruturais de concorrência dos mercados que não possam ser resolvidos ou tratados da forma mais eficaz com base nas atuais regras de concorrência (por exemplo, impedir o tipping dos mercados).
A avaliação de impacto paralela sobre a regulamentação ex ante específica das plataformas, a propósito da qual foi lançada hoje, em separado, uma consulta das partes interessadas, abrange o segundo pilar, enquanto a consulta das partes interessadas aqui em causa diz respeito ao terceiro pilar.
A experiência da Comissão com a aplicação das regras de concorrência da UE no mercado digital e noutros mercados, bem como o processo de reflexão sobre a adequação das regras de concorrência existentes efetuado pela Comissão e as autoridades nacionais da concorrência, ajudou a Comissão a identificar certos problemas estruturais de concorrência que as atuais regras não conseguem resolver ou não conseguem resolver da forma mais eficaz.
O novo instrumento de concorrência deverá permitir à Comissão colmatar as lacunas das atuais regras de concorrência e dar resposta aos problemas estruturais de concorrência em todos os mercados de forma atempada e eficaz.
Após identificar um problema estrutural de concorrência através de uma rigorosa investigação de mercado, durante a qual os direitos de defesa serão plenamente respeitados, o novo instrumento deverá permitir à Comissão impor medidas comportamentais e, se for caso disso, estruturais. No entanto, não deverá haver qualquer constatação de infração, nem deverão ser aplicadas quaisquer coimas aos participantes no mercado.
Próximas etapas
A Comissão está a consultar as partes interessadas dos setores público e privado, incluindo autoridades da concorrência e organismos governamentais, profissionais do meio académico, do direito e da economia. Os inquiridos são convidados a apresentar as suas observações sobre a avaliação de impacto inicial até 30 de junho de 2020 e a responder à consulta pública até 8 de setembro de 2020 em qualquer uma das línguas oficiais da UE. Sob reserva do resultado da avaliação de impacto, está prevista uma proposta legislativa para o último trimestre de 2020.
Contexto
O direito da concorrência da UE prevê a proibição de acordos e práticas concertadas anticoncorrenciais entre empresas, no artigo 101.º do TFUE, e de abuso de posição dominante por parte de uma empresa, no artigo 102.º do TFUE. No entanto, alguns problemas estruturais de concorrência estão fora do âmbito de aplicação das regras de concorrência da UE ou não podem ser resolvidos da forma mais eficaz.
Os problemas estruturais de concorrência podem surgir em diferentes cenários, mas podem ser agrupados em duas categorias, em função de o prejuízo estar prestes a afetar o mercado ou de já ter afetado o mercado.
- Riscos estruturais para a concorrência: Certas características dos mercados (por exemplo, efeitos de rede e de escala, ausência de multifornecimento [multi-homing] e efeitos de lock-in), juntamente com o comportamento das empresas que operam nesses mercados, podem constituir uma ameaça à concorrência. É exatamente este o caso dos mercados em risco de «tipping». Os riscos para a concorrência surgem através da criação de operadores de mercado poderosos com uma posição enraizada no mercado e/ou numa posição de controlador de acesso (gatekeeper), o que poderia ser evitado através de uma intervenção precoce. Nesta categoria estão ainda incluídos casos em que empresas não dominantes recorrem a estratégias unilaterais para monopolizar um mercado através de meios anticoncorrenciais.
- Ausência estrutural de concorrência: Algumas estruturas de mercado não produzem resultados concorrenciais (ou seja, uma deficiência estrutural do mercado), mesmo excluindo as empresas que atuam contra a concorrência. Por exemplo, os mercados podem apresentar falhas sistémicas devido a certas características estruturais, tais como elevada concentração e barreiras à entrada, lock-in de consumidores, falta de acesso a dados ou acumulação de dados. Do mesmo modo, as estruturas de mercado oligopolistas aumentam o risco de colusão tácita, nomeadamente os mercados com maior transparência devido a soluções tecnológicas baseadas em algoritmos, que estão cada vez mais prevalecentes em todos os setores.
A avaliação de impacto de um eventual novo instrumento de concorrência não prejudica a atual regulamentação específica do setor nem os atuais instrumentos de concorrência ao dispor da Comissão e das autoridades nacionais de concorrência dos Estados-Membros da UE. É também complementar à avaliação de impacto sobre a regulamentação ex ante específica das plataformas realizada em paralelo pela Comissão, que faz parte do pacote legislativo sobre os serviços digitais, anunciado na comunicação «Construir o futuro digital da Europa».
Para mais informações
Ligações para a avaliação de impacto inicial e o questionário
Ligações para a avaliação de impacto inicial relativa ao ato legislativo sobre os serviços digitais e o questionário
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